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Thursday, November 02, 2017

Finados?

Então é Dia de Finados.

O dia dos que tiveram fim.

Seria isso mesmo?

Sim, quando penso que é impossível não chorar por causa da ausência de meus pais, que se foram justamente quando estavam tendo algum conforto material. Não há beijo, nem abraço, nem bom dia e fica uma certa impressão do mais ensurdecedor dos silêncios.

Não, quando penso que a ausência física é apenas física, porque os sinto por perto o tempo todo.

Para tentar aliviar a tristeza das perdas, comecei a escrever feito louco, o que me permitiu ser publicado e, com isso, ter ajudado na alegria de milhares de pessoas. Muitas vezes recebo mensagens de pessoas que dizer ter chorado ao ler algo que escrevi, mas não creio que seja por tristeza. É o que elas dizem.

Não aliviou, mesmo com treze livros em pouco menos de sete anos. A tristeza volta toda hora, só que com o passar do tempo ela é combatida com muitas lembranças divertidas e também inspirações. E então continuo escrevendo. Esta foi a principal razão: fazer da tristeza a reflexão.

Meus pais, os escritores que leio, os músicos que ouço, os artistas que vejo, os poetas, os homens de visão social, todos eles estão mortos, mas nem tanto. Todos eles estão aqui perto de alguma forma praticamente todo dia.

Tenho andado há meio século pelas calçadas do mundo, aprendendo, sofrendo, sonhando. Entender todas as injustiças é difícil demais, porém esta mesma dificuldade é também a vida. A vida. Não sei se um dia alguém pensará em mim ou me sentirá por perto, mas sei que eu mesmo sinto isso quase todo dia por muita gente.

Os finados são na verdade continuados.

Existe amor, por mais estranho que pareça dizer isso em meio a uma tempestade de ódios, recalques e pequenez humana, como se pode ver diariamente pelo mundo. Mas o ódio é dos infelizes, dos que têm consciência da própria mediocridade, dos que usam a inveja como ópio, dos pobres egoístas e pernósticos.

Existe amor. Eu sei e sinto isso, até mesmo nas palavras que não foram escritas ou ditas.

Os finados estão vivos demais.

Vivamos também.

@pauloandel

1 comment:

Luiz Vieira said...

Paulo, você como um cara vivido tem as palavras certas para percebermos o que está acontecendo em nossa volta. Obrigado!